A criminalização da universidade e da educação

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Os assuntos da aprendizagem têm sido tratados de maneira bizarra pelo grupo que comanda Brasília. Fugindo totalmente das metas traçadas para os 100 primeiros dias de governo, o ministro da educação agora vive de reuniões interministeriais para tratar de assuntos nada pedagógicos. A prioridade mesmo na “redução do analfabetismo a partir de evidências científicas” não se viu até agora. Por outro lado, parece que se confirma a cada dia que o MEC é usado indevidamente, desviando-se de suas funções particulares para servir a projeto de doutrinação e modelagem da identidade nacional.

Na semana que passou, uma reunião interministerial resultou em protocolo de intenções para instalação da chamada “Lava Jato da Educação”. Segundo o ministro professor, investigações internas demonstraram irregularidades em programas como PROUNI e PRONATEC, o que leva à necessidade de aprofundamento nas investigações para caçar “pessoas que usaram o MEC e as suas autarquias”. Claro sintoma persecutório quando o presidente comemora em seu perfil, dizendo que vai atrás dos que foram corruptos “na gestão passada”.

Fazendo uma análise contida, encontro diversos elementos que demonstram fragilidade nos argumentos e nas justificativas para a iniciativa. Ninguém se opõe a investigações irrestritas, mas sempre pelos motivos certos e pelos meios constitucionais que existem. Pra se ter ideia, o ministro associa os supostos crimes a quem usou o MEC e as autarquias (certamente referindo-se às universidade federais), embora reconheça que os indícios apontam principalmente para irregularidades no Sistema S e nas instituições particulares de ensino superior. Ou seja, o único efeito prático desse circo midiático foi derrubar o preço das ações das gigantes do mercado da educação.

São medidas malucas como essas que levam a outras, essas sim que têm impacto direto na rotina de estudantes e de todos na comunidade-escola. Essa mesma mania de criminalização das ações sociais no campo da educação provocou recentemente uma tragédia. A guerra ideológica dentro dos “muros” da universidade é forte pista de que as coisas não andam bem na arena política. O que deveria ser exceção, em casos de flagrante perigo social, se torna a regra no faroeste da política rasteira.

Como salvar a própria pele é a lei natural, já começam a aparecer os intelectuais alinhados com as novas diretrizes. Exemplo está na UFF, que baixa portaria (n° 63.083 de 11/02/2019) para institucionalizar uma assessoria ao gabinete do reitor, com a finalidade de estabelecer intercâmbios com o Ministério da Defesa e com as Forças Armadas. A reação imediata na comunidade universitária interna foi de apreensão e desconfiança. É fato que parcerias dos setores da saúde e das engenharias (da UFF) com as Forças Armadas já são efetivadas há anos, porém no momento atual as suspeitas são de aparelhamento dos militares nos quadros da universidade. A associação dos docentes, por exemplo, demonstra grande preocupação com as vias que foram utilizadas para viabilizar a medida. Não sem razão, editar portaria da reitoria sem consulta à comunidade, com a finalidade de estreitar exclusivamente a relação da reitoria com os militares, só poderia mesmo resultar em polêmica – no mínimo.

Sinceramente, procurava um tema em educação para comentar nessa semana, mas não imaginava que teria que tratar das ingerências sobre o campo. Há semanas fico ansioso por mobilizar meus conhecimentos e minha experiência, na escola e na universidade, para discutir ideias e ações da “nova era” no Ministério da Educação. Infelizmente, tudo que encontrei até hoje me faz crer que o ministério se transformou num puxadinho da comunicação oficial, uma correia de transmissão na engrenagem que procura moinhos de vento para disfarçar a falta de noção e foco. O conhecimento técnico pedagógico está totalmente ausente, tanto no “bate papo com o professor” quanto nas negociações com os outros ministérios. Em regimes de exceção, a criminalização do espaço escolar sempre começa de forma individualizada, mas sempre atinge toda instituição educacional e costuma comprometer o livre pensar de muitas gerações.

 

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